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5/04/2019

Logística reversa evolui, mas ainda encontra desafios no Brasil

Página Sustentável / abril 04, 2019

Entre todas as obrigações ambientais do setor empresarial brasileiro, uma se destaca como a responsável por garantir que produtos descartados pelos usuários sejam reciclados. Esse processo é chamado de logística reversa, não sendo apenas um dever do fabricante, mas também de importadores, distribuidores e comerciantes de produtos. Hoje, no Brasil, alguns tipos de produtos possuem uma cadeia de logística reversa já bastante desenvolvida, ou em vias de, por já possuírem acordo setorial ou regulamento com regras claras para a prática. É o caso das embalagens de agrotóxicos, óleos lubrificantes e lâmpadas.

Outros produtos, no entanto, ainda estão em fase de discussão, como os medicamentos e eletroeletrônicos. O retorno dos produtos é viabilizado, entre outras maneiras, pela compra dos materiais recicláveis, instalação de pontos de entrega (PEVs) e também por parceria com cooperativas de catadores.

De acordo com o advogado Fabricio Soler, sócio do Felsberg Advogados, um dos principais desafios para o funcionamento e a ampliação da logística reversa no Brasil é a ausência de um tratamento fiscal diferenciado para os resíduos: “Já são tributados a matéria-prima e o produto e, acredite, o Estado ainda tributa o resíduo que retorna, quando na verdade deveria isentá-lo para fomentar o desenvolvimento da cadeia de reciclagem.”

Outra questão importante é a dificuldade em relação ao transporte dos materiais. Como o Brasil é um país de grandes dimensões territoriais, é custoso fazer com que esses materiais retornem até o polo reciclador – quase sempre na região Sudeste que concentra a maior parte dessas indústrias. “Neste sentido, também temos a dificuldade com a pulverização de legislação que tenta regulamentar a prática, muitas vezes sem observar as diretrizes nucleares da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS)”. Em nove anos da PNRS, houve mais de 500 atos normativos sobre resíduos nas três esferas de poder, federal, estadual e municipal. A multa para quem não respeita as regras previstas pode variar entre R$ 5 mil e R$ 50 milhões.

Estes são alguns dos entraves, visto que a logística reversa em si pressupõe uma viabilidade técnico-econômica para implementação gradual. Para Soler, o melhor exemplo de sucesso neste quesito é o sistema de lâmpadas, onde os importadores são obrigados a recolher o valor aproximado de R$ 0,41 por unidade. Isso tende a garantir a sustentabilidade econômica porque o preço final, repassado ao consumidor, incluirá o valor dos custos, ainda que parcialmente, da logística reversa.

Na visão do especialista, porém, é um erro encarar o processo como uma obrigação meramente empresarial, sendo que o gerador do resíduo em si é o consumidor que utiliza os produtos fabricados, importados, distribuídos e comercializados em território nacional. “É indispensável o papel do usuário na devolução dos produtos. O consumidor tem que fazer parte do processo. Não adianta ter estrutura se ele não adere. O cidadão é fundamental dentro da viabilização da logística reversa”, diz Soler.

Segundo a análise feita pelo Sindicato Nacional das Empresas de Limpeza Urbana (SELURB), em parceria com a consultoria PwC, a PNRS é clara ao estabelecer a responsabilidade compartilhada pela logística reversa dos resíduos sólidos entre governos, iniciativa privada e consumidores. O engajamento com a questão é um dos fatores que compõem o cálculo do Índice de Sustentabilidade da Limpeza Urbana (ISLU), que mede a aderência dos municípios à PNRS.

Serviço em expansão

No maior aterro sanitário da América Latina, em Caieiras, há uma área destinada à logística reversa. Companhias de diferentes segmentos firmam contrato com o aterro para a prestação de serviços como armazenamento de materiais de alto valor agregado, caso de produtos farmacêuticos não usados, destruição de cargas danificadas para acionamento de seguro e separação de baterias e outro materiais de eletroeletrônicos para posterior venda ou exportação para o processo de fundição, que é feito na Europa.

Segundo o analista técnico operacional da Essencis, empresa responsável pelo aterro, Wilson Scapin, o processo de logística começa pelo recebimento da carga, passando pela triagem, limpeza e armazenamento dos materiais. Depois que um lote é formado, os resíduos são devolvidos aos clientes ou para as empresas recicladoras.

“Os materiais obtidos pela logística reversa não retornam para o seu originador em si, é importante ressaltar, mas sim para a cadeia de produção. Um dos principais desafios hoje é convencer os fabricantes da importância desse processo. Existe um ganho de marca expressivo, uma vez que se trata de um serviço voltado ao meio ambiente. Além disso, é um serviço em expansão. Estamos ampliando nossa operação em logística reversa para o Rio de Janeiro e Minas Gerais”, revela Scapin.