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27/11/2020

Escritórios de advocacia avançam, mas ainda há muito para alcançar a equidade racial

Pesquisador e professor da FGV falou durante live a convite do DiversiFeA do Felsberg Advogados

Apesar dos avanços nos últimos anos, ainda estamos distantes de conseguir a equidade racial nos escritórios de advocacia. Essa é a conclusão do pesquisador e professor da Fundação Getúlio Vargas, Thiago de Souza, que falou sobre racismo durante live realizada pelo grupo DiversiFeA, do Felsberg Advogados, em 26 de novembro.

Graduado pela PUC-SP, com mestrado e doutorado em direitos humanos pela Central European University, em Budapeste e pesquisador visitante na Universidade Columbia, em Nova York, Thiago de Souza teve o racismo e suas consequências como tema central de seus estudos. Atualmente ele é professor da disciplina de discriminação e diversidade na Fundação Getulio Vargas, em São Paulo.

Para o pesquisador, historicamente o país tem convivido com o racismo e o perpetuado. “Fomos o último país das Américas a abolir a escravidão, em 1888, e somos um dos países com o maior número de assassinatos de negros. O mercado de trabalho também é excludente. Há um longo processo de violação da população negra. Mesmo que os negros sejam bem capacitados, muitas vezes a seleção nas empresas é excludente. Para cargos de chefia, ocorre uma busca por indicação — e o networking perpetua a exclusão”.

Durante sua apresentação, Souza lembrou que existe um racismo estrutural, presente em todos os setores da sociedade. “O racismo não é apenas a vontade de uma pessoa, de um indivíduo que se recusa a sentar-se à mesa com outro. Quando uma pessoa olha para outra, forma-se uma opinião permeada por códigos sociais. O racismo está dentro das fissuras sociais. O fato da sociedade reconhecer que existem espaços, como restaurantes caros, lojas chiques, onde não há negros, é a naturalização do racismo. Além disso, as dificuldades em obter melhores condições econômicas e escolares perpetuam a segregação.”

Equidade racial nos escritórios

Durante o encontro on-line, Souza destacou que levantamentos indicam que apenas 1% dos advogados dos grandes escritórios é negro. “O estudo também aponta que 11% dos funcionários brancos são sócios”, lembra.

Para o pesquisador, os programas de diversidade são um primeiro passo para mudar essa realidade, “mas focam na contratação de estagiários e trainees, mantendo os cargos de gestão muito desiguais”. “Além disso, é necessário combater a cultura racista que frequentemente permeia esses ambientes, com foco no racismo recreativo”.

Para reduzir o racismo interpessoal no local de trabalho, Souza vê uma saída que é a contratação de negros. “Sabemos, por meio de muitas pesquisas em ciências sociais, que a maneira de fazer com que as pessoas mudem seus estereótipos sobre outros grupos é fazê-las trabalhar lado a lado com membros de outros grupos como iguais”

Mas não é apenas nos escritórios de advocacia que ocorre a ausência de diversidade racial. Souza lembrou que apenas 18,1% dos magistrados brasileiros são negros, segundo levantamento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) divulgado em 2018. E apenas 1,6% são pretos e 16,5% pardos.

Law Firm Antiracism Alliance

Em junho deste ano, o professor lembrou que mais de 250 escritórios aderiram à Aliança que objetiva abordar não apenas os ataques individuais à igualdade e à justiça social, mas às estruturas existentes que permitem que essas desigualdades se propaguem.

A Aliança propõe, segundo Souza, “angariar recursos do setor privado para, em parceria com organizações de serviços jurídicos e defensores da equidade racial, amplificar as vozes de comunidades e indivíduos oprimidos pelo racismo e usar a lei como um veículo de mudança”. “Os participantes da iniciativa terão que combinar seus objetivos grandiosos com um autoexame profundo para que possam causar um impacto significativo”, analisou.

Para o pesquisador, esses escritórios terão que fazer alguns questionamentos. “Em primeiro lugar, o que a Aliança entende pelo termo antirracismo? Esses escritórios reconhecerão e enfrentarão o papel que desempenham neste sistema de desigualdade? Até que ponto estão dispostos a demonstrar seu compromisso?”.

“A forma de alcançar o objetivo de diminuir a desigualdade racial é os advogados brancos reconhecendo seus privilégios, patrocinar colegas de trabalho marginalizados, aceitando feddbacks, os escritórios trazerem a diversidade para o debate, e insistir em candidatos diversos, construindo uma comunidade de aliados”, afirma.

Para isso, Souza destacou formas de criar condições para enfrentar a discriminação, apontadas pela Harvard Business Review. “É preciso criar consciência do problema, da causa raiz, ter empatia, importando-se o suficiente com quem sofre as consequências dessa desigualdade, e lidar com o problema com três fontes simultâneas: atitudes pessoais, normas culturais informais e políticas institucionais formais”.

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