Meta é tirar do lixo 22% das embalagens
Por Sergio Adeodato
Mais de cinco anos após a aprovação da Lei 12.305/10, que estabelece a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), o governo federal deverá formalizar em meados de novembro o acordo com a indústria e o comércio para a logística reversa das embalagens, com a obrigação da coleta após o consumo e retorno como matéria-prima à fabricação de novos produtos.
A meta é reduzir em 22% a quantidade desses materiais destinada a lixões ou aterros até 2017, em relação aos índices de 2011, por meio da ampliação de investimentos na estrutura de cooperativas de catadores e nas estações para entrega de resíduos pelo consumidor.
A estratégia prioriza inicialmente 12 capitais e respectivas regiões metropolitanas para a mobilização de recursos públicos e privados. “A negociação foi complexa e demorada, porque havia diferentes interesses em jogo e nosso objetivo foi garantir equilíbrio de forças, sem riscos de judicialização do processo”, diz Zilda Veloso, diretora do departamento de ambiente urbano do Ministério do Meio Ambiente (MMA). Para ela, “o desfecho trará impacto significativo na gestão de resíduos no país, já que as embalagens representam um terço de tudo que é descartado”.
Depois de receber mais de 900 sugestões de emendas na consulta pública, encerrada em novembro, o texto do acordo sofreu mais mudanças e a última versão foi aprovada neste mês pelas instâncias jurídicas do governo. O Comitê Orientador para Implantação dos Sistemas de Logística Reversa (Core), formado por cinco ministros de Estado, se reunirá nos próximos dias para o aval final. O principal ponto de discordância envolveu a pressão do poder municipal para as empresas geradoras de resíduos remunerarem o serviço público de coleta seletiva – “pagamento que será definido caso a caso, a partir de arranjos e parcerias regionais entre prefeituras e iniciativa privada”, segundo a diretora.
Como a lei está baseada no princípio da “responsabilidade compartilhada” entre governo, empresas e consumidores, a conta da logística reversa deve ser dividida entre os setores. No primeiro momento, o acordo das embalagens prevê a coleta e reciclagem de 3,8 mil toneladas por dia de resíduos, o que exigirá investimentos do setor empresarial para triplicar o número de cooperativas de catadores no país. Após dois anos o sistema poderá ser revisto.
“Um importante ganho será a formalização da cadeia produtiva da reciclagem, para na segunda etapa alcançarmos resultados mais expressivos a partir de um planejamento integrado”, explica Victor Bicca, presidente do Compromisso Empresarial para Reciclagem (Cempre). A entidade liderou uma coalizão de vinte organizações da indústria e comércio, articulada em torno de uma proposta de sistema técnica e economicamente viável, mantendo o viés social. “O acordo deixa claros as tarefas e os custos de cada um”, diz Bicca, lembrando que a partir de agora, em ambiente normativo mais seguro, “os investimentos nessa estrutura serão potencializados”.
No entanto, será necessário avaliar o impacto da atual crise econômica nos preços dos resíduos e na estruturação do parque industrial reciclador, chave para o escoamento da maior quantidade de materiais que deixará de ir para aterros. “O engajamento do setor produtivo foi estratégico, reforça Fernando von Zuben, diretor de meio ambiente da Tetra Pak, fabricante de embalagens longa vida que integra a coalizão.
“Pode não ter sido o melhor acordo, mas foi o possível”, analisa o advogado Fabricio Soler, especializado no tema. O governo federal poderá ampliar por decreto os termos e obrigações do documento para todos os setores produtivos, inclusive os que propuseram sistemas diferentes de logística. Esses custos, segundo Soler, precisam ser absorvidos pelas empresas: “Quem não deu a devida atenção ao tema precisa agora se mexer” – e isso, segundo o advogado, vale também para as prefeituras.
O êxito das metas de reciclagem depende da coleta seletiva municipal, impulsionada por medidas como o fim dos lixões, que precisariam ser eliminados até agosto de 2014. Mas o Projeto de Lei 2289/2015, que prevê a prorrogação do prazo por até seis anos, passou pelo Senado e está pronto para ser votado na Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados. O MMA contabiliza a existência de 3 mil lixões ativos, destino de quase metade das 215 mil toneladas diárias de resíduos produzidos no país.
“A bola da vez é resolver a destinação adequada do lixo”, adverte Carlos Silva Filho, diretor executivo da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe). A lei determina que para aterros só podem ir os rejeitos, ou seja, os materiais não recicláveis. Para Silva, a questão não está na falta de dinheiro público para a construção de aterros sanitários e plantas para tratamento de resíduos orgânicos, transformando-os em adubo ou biogás. “O problema está na inexistência de recursos para o custeio dessas operações”.
Valor Econômico de 29.10.2015.